“Não
me diga mentirinhas,
dói
demais.”
(Chiquititas)
Desde
muito pequena, fui bem treinada pela minha mãe a não tolerar ou contar
mentiras. “A verdade pode doer, mas uma mentira dói ainda mais”, ela sempre
dizia. E sempre foi fiel ao seu ensinamento.
Eu
mal podia ser considerada gente quando ela me contou pela primeira vez que eu
era filha adotiva. Não com essas palavras, imagino, porque lembrar eu não
lembro. Na época, eu nem devia fazer ideia do que aquilo significava, mas,
segundo ela, achava o máximo e vivia pedindo que ela me contasse de novo a
história de como eu havia chegado à sua vida. Quando já tinha idade suficiente
para entender o que queria dizer, minha reação foi um dar de ombros figurativo.
Eu já estava familiarizada demais com tudo para encucar.
Com
o tempo, eu brincava ao revelar essa informação às pessoas ao meu redor,
recontando a história com uma introdução cômica para a história que muitos
consideravam dramática.
–
Eu apareci na porta dela e perguntei: “Tu qué eu pá tu, qué? E ela quis!”,
brincava. Em seguida, eu contava a história tal e qual ela havia me contado
tantas vezes durante a vida e recebia vários olhares de espanto. As pessoas
pareciam não assimilar a naturalidade com a qual eu lidava sobre o assunto. As
reações eram as mais diversas: iam desde duvidar da história até me dizerem que
eu era normal demais para uma filha adotiva. Pelo visto, esperavam uma rebelde
sem causa.
Eu
não conseguia enxergar o tal drama no roteiro da minha adoção. O único momento
em que eu sentia falta de saber das minhas raízes era no consultório médico.
Sempre que vinha a pergunta “você tem histórico de (insira aqui uma doença) na
família?”, eu e mamãe nos entreolhávamos para decidir de quem era a vez de
explicar a situação ao doutor.
As
verdades de mamãe, apesar de me marcarem para sempre, não deixaram as marcas
que ela bem sabia que as mentiras poderiam deixar. Mentira é cicatriz. Verdade
é tatuagem.
A
honestidade com que lidamos com uma situação que poderia ser delicada acabou
tornando minha mãe uma verdadeira referência no assunto. Até hoje, ela conta
com o maior orgulho, para quem quiser ouvir, de uma tarefa da escola que pedia
que eu escrevesse algo sobre ela. Fui sucinta e escrevi apenas “minha mãe não
mente”.
A
página do livro ainda está guardada junto com outros tesouros da minha
infância. Ela guarda como prova para aqueles que ousam duvidar da história. Nem
tem pra quê. Minha mãe não mente mesmo.
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